A Doença Celíaca (DC) é um distúrbio inflamatório crônico do intestino delgado que afeta 1% da população. A condição pode ser definida como um estado de resposta imunológica intensificada ao glúten ingerido (de trigo, cevada e centeio) em indivíduos geneticamente suscetíveis. O pilar do tratamento da doença celíaca é a adesão vitalícia a uma rigorosa dieta livre de glúten, que leva a melhorias no desfecho clínico, no bem-estar psicológico e na qualidade de vida para a maioria dos pacientes.
No entanto, o número de pacientes que consome uma dieta livre de glúten parece, em grande parte, fora de proporção em relação ao número projetado de pacientes com doença celíaca. Esse agora é um “grande negócio”, e a Reuters projeta um aumento nos lucros do mercado de alimentos livres de glúten nos Estados Unidos de US$1,68 bilhão até 2015. Paralelamente, um crescente problema encontrado na prática clínica é o diagnóstico e o manejo de pacientes que reclamam de sintomas relacionados ao glúten na ausência de marcadores diagnósticos de doença celíaca, como sorologia celíaca negativa e biópsias duodenais normais. Esses pacientes representam um dilema diagnóstico para gastrenterologistas, clínicos gerais e nutricionistas e, no passado, foram descritos como pertencentes a uma “terra de ninguém” devido à incerteza do diagnóstico.
SINTOMAS RELACIONADOS AO GLÚTEN EM PACIENTES SEM DOENÇA CELÍACA
Existem dados observacionais de pacientes que relatam sintomas relacionados ao glúten, mas sem evidências de DC. Apesar disso, esses indivíduos beneficiaram-se sintomaticamente de uma dieta livre de glúten. Historicamente, também tem sido observado que parece haver um aumento na prevalência de anticorpos antigliadina naqueles que reclamam de sintomas relacionados ao glúten e em pacientes com síndrome do intestino irritável em comparação a controles saudáveis, apesar da exclusão de doença celíaca através de biópsias duodenais normais e testes negativos para anticorpos antiendomísio e antitransglutaminase tecidual.
Um grande estudo demonstrou recentemente a existência de sensibilidade ao trigo em pacientes sem DC. As evidências, portanto, sugerem que, mesmo na ausência da DC, produtos à base de glúten podem induzir sintomas abdominais que se apresentam como Síndrome do Intestino Irritável (SII).
O reconhecimento de que as reações ao glúten não se limitam à doença celíaca levou ao desenvolvimento de um documento de consenso em 2012 entre um grupo de 15 especialistas internacionais. Sugeriu-se uma nova nomenclatura e classificação, com três condições induzidas pelo glúten – Doença Celíaca (definição no início do texto),Alergia ao Trigo e Sensibilidade ao Glúten Não
Celíaca:
Alergia ao Trigo: é definida como uma reação imunológica adversa às proteínas do trigo mediada por IgE – pode apresentar-se com sintomas respiratórios (“asma do padeiro” ou rinite, mais comum em adultos), alergia alimentar (sintomas gastrintestinais, urticária, angioedema ou dermatite atópica; principalmente em crianças) e urticária de contato. Os testes para alergia ao trigo incluem dosagem sérica de IgE ou testes cutâneos para o trigo.
Senbilidade ao Glúten Não Celíaca: é uma forma de intolerância ao glúten quando a doença celíaca e a alergia ao trigo foram excluídas. É uma expressão genérica e pode incorporar uma grande variedade de possíveis aspectos clínicos.
A verdadeira prevalência de sensibilidade ao glúten não celíaca na população geral é desconhecida. Além disso, não existem biomarcadores específicos para identificar a sensibilidade ao glúten não celíaca e o desfecho a longo prazo para esses pacientes não é conhecido.
Glúten X Outros componentes do trigo
Também há incerteza sobre se é a retirada do glúten especificamente que beneficia os pacientes, ou se outro componente do trigo é o culpado. A opinião de especialistas e um ensaio clínico sugerem que os frutanos fermentáveis (carboidratos presentes no trigo) podem provocar sintomas gastrintestinais em pacientes com síndrome do intestino irritável. Assim, a retirada do glúten pode, inadvertidamente, estar reduzindo a ingestão de frutanos, que interagem com a microbiota intestinal, havendo produção de gases e fermentação. As evidências atuais que indicam a retirada de oligossacarídeos, dissacarídeos, monossacarídeos e polióis (FODMAPs) fermentáveis para síndrome do intestino irritável podem sobrepor-se a uma dieta livre de glúten.
Recentemente, uma pesquisa avaliou 34 pacientes com Síndrome do Intestino Irritável nos quais a doença celíaca foi excluída e que haviam tido seus sintomas controlados com uma dieta livre de glúten. Em um período de seis semanas, um número significativamente maior do grupo exposto a produtos contendo glúten, mas especificamente preparados livres de FODMAPs (e, portanto, de frutanos) relatou uma diminuição clinicamente significativa dos sintomas, incluindo dor abdominal, distensão abdominal, satisfação com a consistência das fezes e cansaço. Os indivíduos não apresentaram evidências de inflamação ou danos intestinais ao serem desafiados com glúten e, assim, nenhuma pista sobre o mecanismo fisiopatológico envolvido foi obtida. Embora o número de participantes nesse estudo fosse pequeno, os resultados sugerem que o glúten propriamente pode induzir sintomas gastrintestinais em indivíduos com sensibilidade ao glúten não celíaca.
Fonte e Imagem: Sem Gluten Sem Lactose